terça-feira, 2 de agosto de 2011

Se fosses torturada, falavas?

"Se fosses torturada, falavas?" Perguntaram-me há dias.





"Arrastavam-na através do corredor cinzento, despido e húmido. Na sua cabeça esforçava-se por visualizar a expressão de todos aqueles que amava e a haviam amado.


Imagens efémeras e distantes, eram tudo o que tinha para se manter agarrada à razão.


Era nisto que pensava, na efemeridade das memórias amadas, quando a deitaram à força na maca, pendendo-a com força a fivelas de couro. Nem se lhe tinha sido concedido o direito de se contorcer de dor.


Recusando-se a olhar sequer para o seu agressor, que de certo não cederia ao seu olhar amedrontado e suplicante, fechou os olhos, como que antecipadamente desejando o desmaio.


Sentiu uma mão de borracha levantar-lhe a camisola.


Ia começar daí a segundos.


Foi de olhos firmemente cerrados e com os dentes a morder desesperadamente os lábios que sentiu o ferro quente a perfurar-lhe a pele, no lugar do umbigo, através do qual estivera um dia ligada à sua mãe.


A sua mãe.


FALA!


Mãe!


No meio da dor infinita provou o sabor metálico do sangue. Perfurara o lábio com os dentes. Gritou então um grito tão sofredor que talvez matasse.


Sentiu o ferro escaldante perfurar-lhe a carne, descendo através do ventre.


FALA!


Ele. Ele não falaria. Eles não falariam.


Gritou então um grito de amor que não ouviu.


FALA!


O ferro deslizava, cortante cada vez mais através de si. Já não sabia onde sentia a dor. Tentou mexer-se, estrangular-se talvez, não conseguiu.


FALA!


Quero falar, quero falar. O ferro incandescente quase entrando dentro de si.


FALA!


A dor, aquela dor, perfurando-a. Aquela dor que a penetrava. Iam matá-la. MATEM-ME! Não tinha a certeza de a terem ouvido, embora o grito tenha feito eco a cada um dos seus poros.


FALA, E JURO QUE TE MATO DE SEGUIDA!


Elas, as memórias, buscava-as desesperadamente, o brilho de um olhar, a recordação de um cheiro, a suavidade de uma tez... Nada, á dor infernal cavando através de si apoderara-se de tudo.


Gritou de novo, pois de certo falaria se não gritasse.


MATEM-ME!


Já não aguentava mais, abriu finalmente os olhos. Esbugalhou-os. Tudo branco. Voltou a fechá-los e desmaiou."



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Nunca te cales